Sudão – Rivalidades imperialistas por traz da crise de Darfur Portuguese Share Tweet Portuguese translation of Imperialist rivalry behind the Darfur crisis by Greg Oxley and Layla Al Koureychi. (October 4, 2004) No decorrer dos meses recentes, os apuros dos povos da província de Darfur no oeste do Sudão têm recebido grande atenção dos governantes, políticos e noticiaristas ocidentais. Imagens gráficas e relatos foram divulgados acêrca da fome, das doenças e das mortes impostas aos darfuri, das atvidades mortíferas praticadas pelas milícias janjawid armadas pelo regime de Khartum, e das centenas de milhares desesperados homens, mulheres e crianças obrigados a abandonarem suas casase terras, à procura de refúgio no vizinho Tchad ou em improvisados acampamentos “humanitários”. Infelizmente, nada há de excepcional quanto à situação em Darfur. Por todo o mundo subdesenvolvido, e particularmente na África, a fome, o deslocamento em massa de populações, a tortura, o estupro, a pilhagem e os massacres são triviais. E, ainda assim, apenas muito raramente levam-se tais situações ao conhecimento público ocidental, e a espécie de cobertura e “perfil” traçado da crise de Darfur é realmente um bocado excepcional. A crise de Darfur arrasta-se há longo tempo. No entanto, de um ponto de vista puramente prático, podem-se satisfazer as mais imediatas necessidades da população local de forma relativamente fácil. Centenas de milhares de pessoas estao desesperadamente famintas. Recém-nascidos, idosos e doentes morrem em proporções alarmantes. Alguns relatos divulgam dados que se aproximam de 2000 mortes diárias. Por que não se está fornecendo alimentos? A convesa sobre “estradas perigosas” e ações de “bandos armados”, que supostamente impediriam alimentos e outros suprimentos de alcançarem os acampamentos dificilemtne convencem. Fato é que alimento, água, abrigo e socorro médico facilmente poderiam chegar aos acampamentos transportados por aeronaves e helicópteros fretados. No ano passado, em questão de poucas semanas, os governos americanos e britânicos transportaram acima de 250.000 militares, tanques, viaturas, aviões e toda uma “parafernália bélica de apoio”, posicionando-os para a invasão do Iraque. Não é possível levar alguns milhares de toneladas de suprimentos para Darfur? A verdade verdadeira é que a administração dos Estados Unidos não deseja amenizar a situação das tribos de Darfur, precisamente porque tal estado de coisas está sendo aproveitado à guisa de argumento para o bloquear o país. Por traz da acusações oficiais de “limpeza étnica” e “genocídio”, os governantes ocidentais doaram muito pouco dinheiro, e até mesmo um mínimo deste tem-se efetivamente utilizado para aliviar as vítimas da fome e da violência em Darfur. De fato, toda esse embuste sobre a preocupação “humanitária” da parte de Bush e Blair – que jamais hesitaram, tal qual no Iraque, a causar sofrimentos e mortes quando os interesses da “comunidade de negócios” estão em jogo – gira realmente em torno da ganância imperialista por lucros e petróleo. Os imperialistas americanos, em particular, tentam aproveitar as dificuldades do povo de Darfur a fim de impor bloqueio comercial contra o Sudão, com o objetivo precípuo de impedir o acesso de seus principais rivais às jazidas de petróleo nessa parte do mundo. A ameaça de sanções é essencialmente direcionada contra a China, a França, a Índia e a Malásia, todos interessados no petroleo do Sudão. Ao mesmo tempo, a medida está sendo usada como forma de aumentar a pressão sobre o governo sudanês e reforçar acolá a posição militar e estratégica dos Estados Unidos. Ao nordeste do Sudão ficam o mar Vermelho e os terminais estratégicos vitais petroleiros do litoral ocidental da Arábia Saudita. A intensa pressão aplicada para a imposição de um sanções internacionais contra o Sudão comprova suficientemente o caráter completamente hipócrita da propaganda “humanitaria” americana. Como conseqüência de tal medida, mergulhar-se-ia toda a população sudanesa numa situação similar à existente em Darfur. O Sudão é um país extremamente atrasado. Mesmo sem a devastação resultante de um eventual bloqueio, a vasta maioria do povo encontrra-se em estado desesperador de miséria. Tal restrição significaria nada menos do que a fome gneralizada. Outro argumento empregado pelo governo dos Estados Unidos em favor de sanções economicas é a acusação de que o governo sudanês está cometendo “genocídio” em Darfur. Na sessão do Conselho de Segurança das Nações Unidas, no início de setembro, esta alegação dominou o “debate” sobre o Sudão. Ninguém mencionou a palavra petróleo. Contudo, todas as partes interessadas sabiam perfeitamente bem que era o ouro negro o âmago da questão em jogo, inclusive naturalmente a delegação chinesa, que veementemente opôs-se à imposição de um bloqueio. A delegação norte-americana insistiu no emprego do termo “genocídio”, com o objetivo de reforçar as justificativas para a providência e examinar a possibilidade de intervenção militar direta num estágio posterior. Usou-se o termo “genocídio” de igual forma em relação aos albaneses, a fim de legitimar forçosamente a guerra contra a Sérvia em 1997, enquanto em Ruanda – um país de relativamente pouca importância para os Estados Unidos – a adminmistração Clinton recusou-se qualificar como “genocídio” a matança de aproximadamente um milhão de tutsis. Os desabrigados e famintos de Darfur representam apenas fatores insignificantes na cartada por lucros e petróleo. A luta pelo controle do petróleo sudanês Em 1980, a França adquiriu direitos de exploração e extração de petróleo no setor do “bloco B” (agora “bloco 5”), que cobre uma área de 120.000 quilômetros quadrados, correndo do norte para o sul entre Malakal e Bor e, para o leste, na direção da fronteira com a Etiópia. Prospecções sísmicas efetuadas por engenheiros franceses revelaram que o bloco detinha considerável potencial para a produção petrolífera. No presente, acredita-se que o Sudão possui as mais importantes e inexploradas reservas de petróleo da África, até mesmo maiores que as do golfo da Guiné. As exportações de petróleo agora correspondem a 70% do produto interno bruto (PIB) do Sudão. Não obstante, em 1985 a França viu-se forçada a suspender operações na área por efeito da guerra entre as forças armadas sudanesas e o Exército Sudanês de Libertação dos Povos do Sudão (SLPA, sigla americana). Durante todas as recentes guerras, o imperialismo francês tem-se constituído no principal apoio do regime sudanês, provendo-o de armas, de tanques, de aviões e de inteligência militar em suas operações contra as forças rebeldes sulistas. Os Estados Unidos, por outro lado, manipulando organizações mercenárias e atuando através de estados africanos, têm prestado apoio militar a exércitos rebeldes que operam a partir de Uganda, da Etiópia e da Eritréia, numa tentativa de enfraquecer a posição do governo sudanês e de evitar que a Total-Fina-Elf reinicie operações no bloco 5, e privilegie-se em contratos de exploração e produção do peteróleo. Enquanto permanece mantendo a pressão militar e incentivando a destabilização do país, a administração americana está determinada a impedir que quaisquer outras potências consolidem suas posições respeitantes ao petróleo sudanês. Conforme temos visto, a França, a despeito de haver conseguido contratos faz 24 anos, para a explocação e extração do petróleo sudanês, não tem conseguido prossguir em seus objetivos por causa da guerra no sul. A companhia canadense Talisman Energy tem estado também sob forte coação dos Estados Unidos, e agora se defronta com acusações de “cumplicidade em genocídio e crimes de guerra” num tribunal americano, com referência a operações anteriores da mesma empresa no Sudão. A exploraçáo do petróleo no Sudão começou na recuada década de 1960, mas a exportação de petróleo só teve andamento em 1993. O grupo americano Chevron pulou fora do Sudão em 1985, após investir bilhão e meio de dólares. A Chevron descobriu petróleo em vários locais, mas em volumes por demais reduzidos, não se justificando, portanto, manter sua concessão numa zona de guerra. Ao tempo em que a escala real das reservas de petróleo se tornou aparente, as companhias americanas já se encontravam ausentes. Em 1997, as sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos invalidavam investimentos americanos no Sudão. Desde então, a produção petrolífera sudanesa alcançou 500.000 barris diários, comparados aos 270.000 conseguidos em 2005, e poderia provavelmente chegar a 750.000 barris por dia ao final de 2006. Os lucros e reservas petroleiros estão indo para rivais dos Estados Unidos, particularmente com destino aos cofres da China. A emergência da China enquanto potência maior na arena mundial apresenta ameaça direta aos interesses imperialistas ocidentais em geral e ao imperialismo americano em particular. Em 2003, as importãções de petróleo chinesas elevaram-se surpreendentemente em 40% acima do volume do ano precedente. Na atualidade, a China conta aproximadamente com 50 grandes projetos petrolíferos e petroquímicos em curso no cenário internacional. Ela necessita garantir suas próprias reservas de petroleo. Esta necessidade vital apenas pode-se assegurar por meio de um desafio à posição dominante dos Estados Unidos. No momento, todas as suas importações do Sudão representam 6% do total importado pela China. É provável que este percentual cresça aceleradamente, dados os investimentos maciços da China na indústria petrólifera sudanesa desde os anos 1990s. A estatal chinesa do petróleo, a China National Petroleum Corporation (CNPC), tem uma partipação de 40% no capital da Greater Nile Petroleum Operating Company (GNPOC), controladora de dois dos mais importantes campos petroleiros da província sudanesa do Alto Nilo. Partindo dos meados de 2005, a CNPC começará a produzir petróleo na bacia do Melut a leste do Nilo. Outras companhias chinesas também estão envolvidas na construção de um oleoduto de 1400 quilòmetros da bacia do Melut até Port-Sudan, onde a China constrói um terminal portuário exportador de petróleo. A China transformou-se no maior parceiro comeercial do Sudão. Significativamente, os únicos contratos de concessão petrolíferos na região de Darfur foram firmados com a CNPC. Geograficamente, o Sudão ocupa importante posição estratégica. A China está em processo de consolidar sua influência no Sudão, que o utlizará como plataforma de negócios e transporte de petróleo entre a África Central, o Oriente Médio e a própria China. Esta situação é inaceitável para Washington, que até mesmo está propenso a dividir o Sudão em duas ou mais entidades se não lhe for possivel obter acesso aos campos petrolíferos por outros meios. Entre as diferentes manobras envolvendo as milícias do sulinas, o governo norte-americano vem promovendo algumas que advogam a secessão do norte do Sudão, nestas incluindo umas particularmente reacionárias “missões cristãs” contando com poderosos apoios financeiros estadunidenses e que vêm se esforçando há muitos anos no fomento do ódio racial contra os “árabes”. Mas a administração americana não permite que considerações religiosas interfiram no problema oncreto. O governo americano não apenas proveio treinamento militar, armas e dinheiro ao SPLA, pois também tem ajudado o Movimento Justiça e Igualdade (JEM, sigla americana) sediado em Darfur, o qual, por sua vez, é ligado ao fundamentalista islâmico Al Turabi, que ajudou Al Bachir a empolgar o poder em 1989. Al Turabi foi afastado por Al Bachir em 2000, e assinou acordo com o SPLA no ano seguinte. Ele se encontra presentemente detido pelas autoridaddes de Khartum. Ditadura, instabilidade e guerras regionais O regime de Al Bachir constitui uma ditadura islâmica terrivelmente reacionária. Sua história é um caudal de prisões arbitrárias, surras, amputações, torturas e execuções. À semelhaça dos regimes que o precederam, a atual tirania é débil e instável. Firma-se essencialmente no apoio das elites árabes muçulmanas do norte e no aparelho repressivo militar e policial. O Sudão é um impressionante exemplo “combinado de desenvolvimento desigual”. Indústrias e relações sociais modernas existem ao lado das mais primitivas formas econômicas e sociais. Na realidade, não há nação sudanesa. No norte, principalmente a população de fala árabe e muçulmana é composta de um número de diferentres povos espalhados por sobre áreas desérticas e semidesérticas. Com exceção de pequenos núcleos, os laços tribais ainda predominam. Mesmo no interior das cidades, os vínculos tribais ainda representam um fator maior nas relações sociais. Na direção sul, o Sudão estende-se para dentro da “África negra” não-muçulmana e não-árabe, onde o tribalismo se apóia em bases sócioeconômicas ainda mais primitivas. O sul tem sofrido discriminações econômicas, políticas e religiosas em benefício ds elites dirigentes do norte. A charia - lei islâmica – é mposta por igual, tanto a muçulmanos quanto a não-muçulmanos. Tensões e conflitos entre o norte e o sul têm sido a característica recorrente na história sudanesa, mas o começo da presente guerra e a emeregência da SPLA recuam para 1983. A classe dirigente e o débil aparato estatal em Khartum nunca puderam unificar o país e consolidar sua autoridade entre os povos nessa parte extremamente atrasada da África. Nos anos 1980, sob a ditadura de Nimeiri, que se instalou em 1969, o exército sudanês se compunha de tão-somente 50.000 soldados, no seio de uma população de aproximadamente 38 milões de habitantes. A instabilidde da ditadura resumiu-se no fato de que entre 1969 e 1985, quando foi finalmente derrubada por uma greve geral insurreicional em Khartum e Omdurman, se registraram não menos de 25 tentativas golpistas, 18 das quais ocorreram nos primeiros 6 anos. Uma destas, de inspiração esquerdista, apoiada pelo partido comunista, em julho de 1971. Nimeiri sobrrviveu ao golpe, esmagando o partido comunista. Inicialmente, este partido apoiara Nimeiri, a despeito da presença no governo da ultra-reacionária Fraternidade Muçulmana. A própria Fraternidade Muçulmana deu outro golpe em julho de 1976. Enfrentando crescente descontentamento no país, Nimeiri tentou provocar conflitos interétnicos em Darfur e no sul por meio de uma “redivisão” em moldes tribais. O sul também destabilizara-se pelo influxo de mais ou menos 30.000 refugiados armados de Uganda, em seguida à queda de Idi Amin. No exército sudanês a inquietação aumentava, especialmente entre as tropas originárias do sul. Nimeiri empreendeu uma onda de prisões entre os líderes oposionistas sulinos em janeiro de 1983, e as tropas rebeldes em Bor receberam ordem de deixar o sul. Deviam ser substituidas por tropas pró-governamentais do norte. Quando se recusaram a sair, Nimeiri ordenou que tropas leais as esmagassem. Como resultado, motins e deserções em massa registaram-se em praticamente todas as guarnições urbanas do sul, resultando na formação do SPLA, sob a liderança do corenel John Garang. Um ano após a greve geral de 1958, eleições legislativas foram organizadas e estruturou-se o governo Sadiq Al Mahdi. A guerra no sul continuou. Sadiq Al Mahdi prometeu rever a imposição da charia, mas falhou no cumprimento de sua promessa. A SPLA ocupou a cidade de Bor, no sul. Em 1989, o governo foi finalmente derribado por um golpe de estado sob a liderança de Al Bachir, que se tem mantido no poder desde então. À semelahança de Nimeiri antes dele, Al Bachir tentou firmar sua posição no norte através de uma política de “arabização” forçada e “islamização”. Este programa não pôde ser exectado na prática. Os povos ao sul do Sudão nunca aceitarão a mposição da charia, e o governo de Khartum é demasiado fraco para derrotar as forças sulistas pelas armas. De outra forma, o SPLA comprovadamente foi incapaz de ocupar o norte, depois de mais de 20 anos de guerra, durante os quais algo em torno de 2 milhões de indivíduos perderam a vida. Os termos do “acordo de paz” Sob pressão de Washington, um acordo relacionado com a guerra no sul foi finalmente assinado no início deste ano, com base no “Protocolo Machakos” de 2002. Este estipulava uma divisão em partes iguais dos recursos petrolíferos entre o governo de Khartum e uma “administração autônoma” no sul, com a promessa da realização de um referendo sobre a independência para o sul após o período transicional de seis anos. Se algum tempo este acordo vigorar, significará que o sul “autônomo”, conquanto nominalmente sob o domínio da ala política da SPLA, tornar-se-á de fato um estado petrólifero satélite do imperialismo americano. Esta jogada efetivamente importaria na expulsão da França e na transferência da maior parcela das reservas petrolíferas conhecida para companhias estadunidenses. No entanto, os estrategistas americanos não estão preparados para aceitá-lo visto que pretendem assumir o controle territorial agora, inclusive das três províncias centrais sudanesas. Todavia, não menos que o total domínio do Sudão pode satisfazer a avidez das corporações petrolíferas americanas e de seus estrategistas militares. Sua meta real é conseguir uma “mudança de regime”. Por meio da desestabilização política e econômica, e do apoio a alguns grupos armados que estão sendo preparados para lutar contra o governo de Khartum, a esperança do imperialismo americano é solapar o atual regime, derrubando-o no final. A instalação de um regime títere pró-americano tornaria acessível as vastas reservas de petróleo sudanesas às companhias americanas, em detrimento de suas rivais. Britânicos, noruegueses e italianos apoiam a estratégia americana, na esperança de participarem da divisão do espólio num estágio ulterior. Tony Blair já declarou que está pronto a mandar 5000 soldados para o Sudão. Na realidade, tudo isto oficialmente rotula-se de “ajuda humanitária” e “amor pela paz”, como é freqüente quando grandes potências pilham e fazem guerras! É contra o segundo plano deste impasse na guerra entre o norte e o sul, combinado com as conseqüências desastrosas da fome e da seca, que os mais recentes conflitos armados em Darfur irromperam. Dois movimentos distintos, armados, empenham-se na luta contra o governo de Khartum. O Exército Sudanês de Liberatação (SLA, sigla americana) é aliado do SPLA no sul. O governo americano vem armando e financiando esta organização. Em seguida, temos o JEM, ligado a Al Turabi, que também se beneficia do apoio americano, não obstante sua liderança linha-dura fundamentalista islâmica. Al Turabi é declarado apoiador de Bin Laden e aplaudiu o ataque ao World Trade Center em 2001. Al Bachir armou e financiou a assim denominada janjawid, que tem efetivado incursões assassinas com a ajuda de tropas regulares contra centros urbanos suspeitos de simpatia para com o SLA ou a JEM, apropriando-se de terras, de colheitas e de rebanhos. Os ataques da janjawid foram freqüentemente precedidos de incursões aéreas das forças armadas. Por exemplo, aviões governamentais repetidamente bombardearam as cidades de Al Tine, Kornoy e Kutum, no norte do Darfur no decorrer do verão de 2003. Kutum foi bombardeada três dias após a retirada da oposição armada. A Resolução nº 1556 adotada pelo Conselho de Segurança da ONU, que ameaçava o governo sudanês de sanções, salvo se a janjawid fosse desarmada, nada resolveu. Al Bachir simplesmente reforçou as forças de segurança na área, e incorporou muitos efetivos da janjawid a suas tropas. Os regimes do Tchad e da Líbia igualmente têm interesses que defender em Darfur. O território de Zaghawa estende-se por ambos os lados da fronteira norte entre o Sudão e o Tchad, e é este grupo étnico que constitui o poder básico de Idriss Deby, ditador do Tchad, tal qual acontecia na ditadura anterior de Hissène Habre. É por este motivo, que eventos em Darfur têm direta influência no destino do Tchad. O regime líbio, em conflito com o Tchad sobre áreas limítrofes disputadas por ambos os paises, envolve-se em acontecimentos em Darfur, onde tenta minar as bases de Idriss Deby. O governo francês desejaria um acordo de paz no Sudão, possibilitando-lhe a exploração dos campos de petróleo no “bloco 5”, mas entende que as bases para as atuais negociações indicam que a França será excluida de qualquer perspectiva de ulterior desenvolvimento no país, dada a posição dos Estados Unidos no sul e a crescente influência da China na região. Os acontecimentos em Darfur, a exemplo igualmente de outros conflitos armados noutras partes da África, constituem a continuação da luta entre o imperialismo dos Estados Unidos e o da França no continente, uma luta na qual esta já perdeu apreciável terreno. Fundamentalmente, a política dos Estados em relação ao Sudão é similar à sua atitude com respeito à Líbia, e à sua política pré-guerra no Iraque. Esta consiste na aplicação de sanções econômicas combinadas com molestamento militar seguido da “cenoura” como consolo da suspensão de sanções ao mesmo tempo em que ameaça o bloqueio econômico completo e até a intervenção militar aberta. O débil regime sudanês não tem condições de resistir indefinidamente a essa espécie de intimidação imperialista. Al Bachir, tentou dobrar-se às exigências de Washington, segundo indicam os generosos termos do Protocolo Machakos, efetivamente colocando um terço do país sob o controle dos Estados Unidos. Na hipócrita linguagem da diplomacia internacional, o sul do Sudão deveria ser posto sob “ativa liderança americana” como parte de sua “assistida vigilância internacional”, tornada necessária a fim de “garantir a paz”. Mas, na seqüência, como aconteceu com Saddam Hussein e os “inspetores de armas”, exigir-se-iam novas e ainda mais mutiladoras concessões. Tanto quanto na Líbia, os estrategistas do imperialismo americano gostariam de levantar as sanções, mas somente se pudessem pôr as mãos no petróleo e em suas vias de suprimento. Em vrtude da posição da China, que se aproveitou do impasse entre a França e os Estados Unidos com a finalidade de obter uma posição forte nos campos petrolíferos sudaneses, os objetivos dos Estados Unidos só poderão ser conseguidos através da completa ruina do governo de Al Bachir e da instalação de um regime disposto a servir aos Estados Unidos. A tentativa de golpe de 24 de setembro foi obra de elementos estreitamente próximos de Al Turabi e da JEM. Mesmo se o golpe lograsse sucesso inicial, seria improvável que Al Turab pudesse manter-se no governo, diante da hostilidade popular na capital. A administração americana tampouco podia tê-lo apoiado inicialmente, em virtude de sua associação com Bin Laden e sua fama de líder fundamentalista islâmico. Washington dispõe-se a incentivar os ataques da JEM em Darfur agora, a fim de criar dificuldades para o regime vigente. Mas o apoio à JEM não podia ir além disto. Nos dias atuais, os serviços secretos americana tentam recrutar oficiais superiores do exército, e formam um grupo de agentes civis sudaneses subornados procedentes dos Estados Unidos. Em virtude da presente situação no Iraque, parece improvável que os a potência hegemônica possa estruturar uma intervenção militar em larga escala no Sudão. Por conseguinte, é inteiramente verossímil que o governo americano queira derrubar o regime por dentro, e em seguida pressione as Nações Unidas objetivando o envio de “uma força de paz” com o propósito de proporcionar suporte militar ao regime títere “provisório”. Enquanto isto, a crise de Darfur será mantida em ebulição, como escusa de sanções contra o Sudão e também para reforçar a presença de forças externas na região de Darfur. A “refrega pela África”, envolvendo grandes potências, continua, enquanto o povo do Sudão e o resto do continente pagam o preço, em termos de fome, doenças e mortes. Outubro de 2004. Tradução de Odon Porto de Almeida.