Peru: Onze notas urgentes sobre o golpe oligárquico contra o presidente Castillo Share TweetNas últimas horas, a crise política se acelerou no Peru. O presidente Castillo decretou o fechamento do Congresso, mas foi rapidamente detido pela polícia. O Congresso votou por seu impeachment e proclamou seu vice-presidente como o novo mandatário. O que significam esses acontecimentos?[Source] Devemos deixar de lado as aparências constitucionais e ir ao fundo dos processos para podermos entender o que aconteceu: a CONFIEP (a patronal), o exército, a polícia, a mídia burguesa, a embaixada dos EUA e as multinacionais mineradoras retiraram, através de seus agentes no Congresso, o presidente Castillo do cargo para o qual foi democraticamente eleito. Trata-se de um golpe reacionário. Castillo, um dirigente sindical dos professores de base, foi eleito contra todas as probabilidades como expressão da ira do Peru profundo, dos camponeses pobres, dos trabalhadores, dos indígenas, de todas as camadas mais oprimidas da sociedade, que aspiravam uma mudança fundamental das relações de poder, para que não existissem mais pobres em um país rico. Os donos do país não podiam aceitar tal fato. Castillo e Peru Livre (PL), no geral, enfrentam duas limitações:– Uma delas, o seu programa político, as reformas sociais, mas sem romper com o marco do capitalismo, era utópico e só podia ter dois resultados possíveis: ou as reformas eram realizadas, rompendo-se com o capitalismo, ou o capitalismo seria mantido sem se realizar as reformas.– A outra limitação diz respeito à aritmética parlamentar desfavorável e, portanto, somente seria possível aplicar a vontade democrática das massas com a pressão das ruas, mas nunca houve um apelo sério para que fosse exercida ou organizada. Uma vez que Castillo aceitou ficar encurralado dentro dos estreitos marcos da institucionalidade burguesa, foi fazendo concessões cada vez maiores, eliminando ministros que não eram do agrado das mineradoras, eliminando o chanceler não aceito pelos milicos, e os que a CONFIEP não queria. Erro fatal, porque a oligarquia não se dava por satisfeita e exigia mais concessões, enquanto cada concessão minava o apoio da própria base social de Castillo, sua única esperança de salvação. Havia alternativa? Sim, havia. Chamar as massas às ruas, dissolver o Congresso e convocar uma Assembleia Nacional Revolucionária, e combinar essa ação resoluta com golpes decididos contra o poder político e econômico da oligarquia capitalista (nacionalização do gás, reversão dos contratos mineiros etc.). Seria uma estratégia arriscada que poderia fracassar? Naturalmente, na luta de classes não há garantias de vitória. Mas pela via da conciliação, se há garantias, vai-se ao desastre. Houve erros também por parte de Cerrón e Peru Livre (PL) que, em algumas ocasiões, flertaram com o fujimorismo no Congresso por puro despeito contra Castillo. PL tampouco foi capaz de construir uma base sólida ou de organizar as massas para pressionar Castillo pela esquerda e, no caso de que não cedesse, se preparar para ultrapassá-lo. Quando Castillo já havia perdido praticamente todo o seu capital político, mesmo com a simpatia dos setores mais oprimidos, mas sem organização ou mobilização, havendo rompido sua bancada parlamentar, então… apela à OEA! Exatamente o mesmo erro cometido por Evo e com o mesmo resultado. Não aprendemos nada. E, finalmente, em um último ato de desespero, para evitar a votação do impeachment, dissolve o Congresso, mas, em vez de se apoiar na mobilização das massas para impor o decreto, parecia estar esperando o apoio… do Exército! A classe dirigente se move como uma máquina bem lubrificada, com um plano preparado com antecedência. Prendem Castillo. Há acordos entre o fujimorismo, a direita clássica e a esquerda caviar. Vota-se o impeachment (com o apoio majoritário das bancadas de PL e da bancada dos professores). A própria vice-presidente de Castillo é nomeada presidente com amplo apoio do Congresso e convoca um governo de “unidade nacional” (ou seja, unidade de todos os partidos contra as aspirações do povo trabalhador). A OEA e os EUA reconhecem o novo governo que não foi eleito. Consuma-se o golpe. Resta saber a reação das massas nas próximas horas. Espera-se que saiam às ruas, particularmente fora de Lima, no sul rebelde e outras províncias. Resta ver em que número e com que grau de decisão. Castillo minou sua própria base social, mas o ódio à oligarquia é profundo. Fora do Peru, resta-nos organizar a denúncia do golpe e ajudar no processo de tirar as conclusões necessárias, para o Peru e para a América Latina. Isso porque, mesmo que o novo regime se consolide, e isso não está garantido absolutamente, esta é apenas uma batalha e a guerra continua.